18 de jul. de 2013

Coelhinhos









Até que para um ser tão pequenininho, ela andou bastante, explorou os caminhos que apareceram e ainda criou alguns outros quantos, se aventurando como fazem os coelhinhos quando saem da toca para conhecer as redondezas.

Teria andado mais, teria feito caminhos novos e quem sabe teria até criado alguns, de acordo com as asas da imaginação que tinha. Para uma coelhinha, ela até tinha uma grande imaginação.

Quando parou, não foi porque a imaginação havia acabado, ou por causa das perninhas curtas ou cansadas. Quando ela parou, não foi porque faltava força nas pernas traseiras para o impulso dos saltos, nem porque apareceram cercados ou abismos. Foi o medo.

Medo que ela sabia muito bem que era o maior inimigo de todos os coelhos, o medo que paralisa quando deveria impulsionar adiante. Mas esse medo que a fez parar era diferente.

Ela não tinha medo dos buracos, ou dos lobos e raposas, ou de algum outro predador qualquer. Também não tinha medo de se perder (já dizia uma grande escritora que perder-se era também um caminho).

Esse medo era outro. Era o medo de que não compreendessem.

Não era um problema os possíveis buracos, abismos, predadores, machucados ou perigos.

É muito mais fácil não termos medo por nós, mas o medo pelos outros. Quando digo os outros, falo daqueles que são os importantes, os principais, os maiores.

Para ela o importante era o caminho, não faziam mal os tropeços ou possíveis consequências. Mas para os outros isso poderia ser importante.

Se o buraco fosse muito fundo, ou se o pior pudesse acontecer, estaria tudo bem para ela – mas estaria para aqueles que a tinham como um dos mais importantes?

Quando, feito o coelho que era, ela foi procurar conhecer o que havia para além do conhecido foi o instinto, a vontade, o desejo de ver o que outros coelhos talvez não tivessem nunca visto ou vivido. Mas era também uma coisa egoísta.

Ela teria histórias, teria vivido uma porção de coisas, aventuras, experiências. Teria vivido uma vida rica, dessas que valem mesmo a pena viver – principalmente para um coelho.

Mas quando chegasse às pessoas importantes alguma notícia menos boa, ou mesmo ruim, iriam eles ter a mesma certeza que ela tinha de que valia a pena, de que teria valido a pena?

Entre os saltinhos de um coelho livre e contente ela pensou sobre isso, e teve medo, e parou. Aquele medo típico dos coelhos ao ver uma serpente – aquele medo que paralisa.

Então ela também pensou na situação oposta... saberia ela entender que os riscos e perigos que cercam aquelas pessoas importantes também fazem parte da vida, e saberia ela compreender e aceitar as escolhas que levariam à possíveis buracos e perigos para essas pessoas?

Teria ela a mesma consciência e certeza que ela esperaria que tivessem caso fosse ela a cair em algum buraco perigoso?

Era muito mais simples e mais fácil percorrer o mundo inteiro, aceitando seus perigos e riscos quando fosse ela mesma a arriscar. Quando os riscos eram para aqueles que viviam no pequeno coração de coelho dela, a história nem sempre era tão fácil ou tão simples...

Foi então que ela percebeu. Já não era mais uma coelhinha explorando o mundo fora da toca, era uma coelha já grande, crescida, e responsável por cada escolha, caminho, perigo ou risco que houvesse.

Aquele medo paralisante ainda estava ali, mas já não paralisava mais – era possível olhar nos olhos da serpente e escolher ficar parada, lutar ou fugir. Qualquer escolha valia, qualquer atitude era acertada. Só uma coisa era importante – mais importante naquele instante que qualquer outra:

Que as pessoas importantes soubessem que os riscos assumidos valeram a pena, valiam a pena e continuariam a valer – eram caminhos (e não existem caminhos errados, todos mostram paisagens e trazem as experiências que foram procuradas). Era importante que as pessoas importantes soubessem que tudo valera a pena. Era importante que ela também carregasse essa certeza em relação às pessoas importantes.

O respeito absoluto pelas escolhas alheias, a aceitação incondicional sobre a verdade que cada um carrega e escolhe lá dentro de si – essa era a grande diferença entre a coelhinha que saiu da toca e a coelha de agora... o aprendizado do que é (e deveria ter sido sempre) o amor.

22 de mai. de 2013

Há dias...



Há dias (e noites) assim... em que tento recriar no pensamento o cenário perfeito, a memória perfeita do sentir-se segura, sentir-se em paz e em conformidade com a vida.

Dias em que, ainda que pareça estar tudo sem sentido, procuro a solidez e o sossego de alguma lembrança para recordar a sensação de estar tudo bem.

Noites em que o sono não vem, e ao fechar os olhos o que vejo são pessoas, situações e imagens que já não existem mais.

Quando quero, em meus pensamentos, retornar ao que era certo, seguro, pacífico, os sonhos se dissolvem, o sono se retira, fica o pensar e o esforço em lembrar, revirando páginas, imagens e escombros nas prateleiras do que lembro.

Quando consigo voltar (e parece que cada vez o caminho de voltar é mais comprido e longe) e resgato o sentimento de coração em paz, penso em quanto tempo se passou, quantos anos, ilusões e enganos cobriram aquele tempo, e então o sono se vai de vez.

Ficam os fantasmas a mostrar quantas águas passaram, e o quanto dessa água nem sequer era límpida. 

Ficam as sombras e as sobras, e os restos que carrego em mim do barro com que moldei as frágeis lembranças.

Há dias e noites assim... em que súbito vem o desejo de lembrar e depois a certeza de que as lembranças são mais sentimentos que verdades.

Há dias e noites assim, que trazem novas manhãs, novas necessidades de abrir os olhos e seguir adiante, pisando nesse barro frágil e já muito usado, fazendo o melhor e o possível para moldar novas formas.

Há dias em que sou restos e farrapos de quem eu antes fui.

13 de mai. de 2013

Primavera



É assim... caminha-se um longo caminho, fazem-se as mais arriscadas escaladas, arranham-se e dobram-se os joelhos... vem o cansaço e a exaustão, e fica difícil ver a possibilidade do amanhã chegar em um dia de sol e sossego. Mas o dia chega.

Os joelhos se curam, as pernas suportam, a mente relaxa. O sol nasce. Quantas viagens, quantas paisagens, quantos caminhos foram feitos? Quantas e quantas histórias para relembrar, para contar...

Mas um dia, o dia nasce diferente. Nasce repleto de possibilidades, e as conquistas obtidas são vistas, assimiladas, digeridas.

Nasce outra vez o sossego e a certeza de tudo estar bem, de tudo estar certo. De ter valido a pena e ter chegado a um fim para que outro novo começo possa surgir.

Hoje deposito as armas da luta ao chão sem derrota e sem alarde, mas com o sentimento de gratidão pela batalha ter acontecido e por todos terem sobrevivido. Uma trajetória cumprida, um sonho realizado, uma experiência adquirida.

Chega o tempo de outros planos, chega a vontade de parar de escalar e escolher um caminho plano, com rios e árvores para apreciar. E deixa de ser tão importante se os passos terão companhia de outros passos, pois somos todos observadores daqueles a quem amamos sem a necessidade de trilharmos as mesmas trilhas para aprendermos a partilhá-las.

Chega um novo tempo. Um tempo mais pleno, um tempo que escolho. Chegou o meu tempo. Mais uma casca rompida, mais uma semente a brotar.

Chegou a primavera em mim. E a aceito... assim, floresço.

Bom dia!

5 de mai. de 2013

Vai...



Vai...

Vai, e deixa ele em paz... não faz mal se dói ou se é triste,
Que o que é mais triste é a tristeza que é sua.

Vai, e não deixa mais que ele sofra
O sofrimento que é só seu.

Então que o tempo passe,
Para mostrar que a solidão é o caminho
Sem impor solidão a ninguém mais.

Vai, deixa que os vôos aconteçam
E a felicidade alcance quem a procura.

Vai, e se cerca das suas paredes e muralhas,
Onde o sol que brilha é único
E ninguém mais pode entrar.

Por quê tentar o que não se quer,
Quando não se quer dividir tudo (vida)
E dividir mais ou menos é ilusão?

Vai... e deixa-o ir
Para ser feliz,
Na felicidade que não sabes.

2 de mai. de 2013

"As vezes me canso de tanto pensar, e pensando, penso que deveria parar de tentar pensar tanto"

23 de abr. de 2013

Especial



Especial mesmo foi ter vivido até aqui. Foi ter tido esse tempo de viver tantas vidas, tantos sentimentos, encontros, desencontros... especial mesmo foi ter tido a chance de aprender a cada um desses ciclos e passos.

Especiais são as pessoas que fizeram tudo isso possível de acontecer. As pessoas que encontrei e desencontrei, que me fizeram sentir um pouco de tudo, dando-me assim a certeza de estar viva.

Especial é estar aqui nesse momento com o peito cheio de ar, os olhos cheios de cores e o coração cheio de memórias e histórias de viver – e reviver.

Mais que meu aniversário, comemorei a decisão e coragem que existiu no coração dos meus pais há mais de trinta e quatro anos atrás – quando todas as escolhas eram possíveis e a escolha feita foi a de mim.

E essa é a essência que carrego para além da minha própria – as partilhas e passos realizados.

E quando alguém me pergunta sobre o futuro, minha resposta ainda é a mesma... eu não sei. Sei que quero matar as saudades que carrego – se os caminhos para lá levarem. Sei que quero partilhar e aprender mais – enquanto houver força e vontade. Sei que sem saber do amanhã, o hoje é cada vez mais vivo, mais colorido.

Sei que especial mesmo não sou e nem fui eu. Foram e são todos... e o especial é ter feito e fazer parte disso – viver.