25 de dez. de 2012

Receita de Novo Ano

Guardei os dias de festa assim como guardei comigo uma porção de silêncio, um bocado de reflexão e uma porção de recordações.

Fiz minha própria receita, juntando pedaços daquilo que já foi, aquilo que agora é e as esperanças, sonhos e ideias do que poderá estar por vir.

Percebi que as melhores receitas se fazem aos pedaços pequenos, pequeninas porções de ingredientes de momentos e de instantes, a atenção que cada um desses instantes teve e as marcas que deixaram, os sabores e as lembranças.

Como quando se coloca a massa de um bolo no forno, pode-se perceber a hora que o mesmo começa a ficar pronto pelo cheiro que se espalha e aquece o ambiente a volta. 

Começo a sentir o cheiro do bolo, sem conhecer ainda o sabor dessa mistura.

Posso reconhecer pelo cheiro que sinto agora alguns dos ingredientes que foram colocados, os momentos de alegria, de saudade, de tristeza, de medo, de coragem. Momentos de partida, de chegada.

Alguns até de desespero, de incompreensão e de medo. Tem no meio dessa mistura um tanto de incerteza, insegurança e força. Tem histórias de vencer os próprios limites, tem atos de loucura e de estupidez, tem gestos de bondade, humildade e também de egoísmo. Tem amor e tem também mágoa. Tem doçura e tem uma pitada de sabores amargos que ficaram.

Não sei qual sabor terá esse bolo, que representa para mim a mistura não só do ano que passou, mas de uma caminhada um pouco maior que isso. Talvez, com o ano novo que chega, que nada mais é senão a mudança de folhas em um calendário, também chegue a hora de experimentar um pouco dos sabores cultivados, colhidos e misturados nessa receita.

Sinto o cheiro do bolo a ficar pronto, sem saber quando ou aonde será a hora de prova-lo, mas carrego a certeza de que a criação dessa receita teve tudo de mim, em cada pequeno pedaço e em cada cuidada mistura.

Que os novos anos que cheguem sejam sempre assim, a chegada de colhermos aquilo que tivermos plantado de melhor e de mais verdadeiro.

Bom apetite!

3 de dez. de 2012

"É um engano pensarmos que os pensamentos são livres. Pensamentos são/ estão condicionados por tudo que nos foi ensinado, pelas circunstâncias e pelas experiências vivenciadas. E somos tão livres quanto permitimos que nossos pensamentos o sejam." Agape


Pequenas lições que aprendi e sigo aprendendo...



#1           O profissional que você é não se mede por seu salário, mas na forma com a qual você faz seu trabalho. Já ganhei muito, já ganhei pouco, já trabalhei de graça. Para cada etapa, um orgulho enorme em saber que independente do “quanto”, o “como” sempre foi e continua a ser o mais importante.

#2           O simples é muitas vezes o mais difícil – e geralmente sempre o melhor. Um gesto simples, uma verdade simples, uma demonstração simples. Querer fazer ou mostrar muito, provoca inúmeras possibilidades desnecessárias para erros e excessos.

#3           Quando existe boa vontade, até o impossível fica mais fácil.

#4           A consciência precisa ser uma escolha individual, não uma imposição. Os cacos que a verdade desnudada deixa não permite ajuda na reparação.

#5           A liberdade só existe quando nos libertamos de tudo que não somos nós.

19 de nov. de 2012

Contexto



Uma peça só faz sentido quando inserida no contexto adequado. Qual seria o sentido de um barco no deserto, ou de uma espreguiçadeira com sombrinha em meio a um cenário de neve?

Não sei qual fator mais importante, se a peça em si ou se o contexto que a envolve. O que é bom ou quase perfeito em determinado contexto, poderá revelar-se o contrário se o contexto for outro?

Sei muito bem que nós temos a capacidade de nos habituarmos a muitas e diferentes situações (e contextos), inclusive com a tendência de muitas vezes aceitarmos ou nos resignarmos com situações que em outros contextos nunca aceitaríamos. 

Acredito que existe um grande desafio em aprendermos a identificar o que é nossa essência e verdade da forma mais independente possível do contexto que nos rodeia no momento. Nem sei se tal coisa é possível – sermos de alguma forma, minimamente independentes do contexto (nossos desejos, limites, etc)

Não sei até que ponto eu sou eu ou se sou uma resposta ao contexto ao qual me deixo envolver. Se busco estender meus limites, é certo que inserir-me em diferentes contextos poderá produzir esse resultado, mas não será que o contexto ao qual me submeto também irá influenciar nos limites que me impus?

Testo, meio sem querer, diferentes contextos dentro de um mesmo cenário. Observo que o cenário muitas vezes molda-se pelo contexto, ou que o próprio contexto adequa-se ao cenário. O que poderia de alguma maneira acalmar-me, me provoca ainda maior desassossego.

Parece que tudo de alguma maneira pode moldar-se, adequar-se. Menos eu.

18 de out. de 2012

Ir não é chegar #1



Quando se vai embora, de certa forma nunca mais se pode voltar. Não se pode voltar ao que já passou, ao que já fomos um dia, ao que já aconteceu.

Quando se vai embora uma vez, há que se ter a consciência de que a vida está a ser movimentada, alterada, modificada. Escolhe-se. Não é possível escolher o todo, o que existiu e o que vai existir – existe um intervalo no meio, o que se escolhe existir agora.

Quando se vai embora, fica uma parte de nós e abrimos espaço para uma parte nova entrar em nossa vida. Podemos ir embora com planos e idéias de regresso, mas nunca saberemos ao certo o que os dias e o futuro nos vai trazer – escolhe-se, opta-se, arrisca-se.

Quando vamos embora uma vez, nunca voltaremos exatamente do jeito que éramos, não voltaremos ao que deixamos – a vida segue seu curso, espaços abrem-se e fecham-se, transformam-se.

Ir embora é escolher um caminho, é fazer uma escolha, é deixar aberta a possibilidade de um dia voltar sem saber ao certo como ou quando. É deixar um pedaço de nós, e levar conosco um pedaço de tudo e de todos que fizeram parte de nossa vida.



 Ir embora não é chegar a algum lugar, é seguir um caminho até que o retorno aconteça.


11 de out. de 2012

É preciso dizer



É preciso dizer

É preciso dizer que eu não sei... tenho agora talvez mais respostas do que perguntas, e ainda não sei...
Não sei como ou qual será o amanhã, de onde ele virá ou como terminará.

Não sei sequer sobre o que eu vejo, o que me parece as vezes tão cruel ou superficial... quem sou eu afinal para saber? Eu não sei...

Não sei sobre qual essa força tamanha que impulsiona as pessoas a quererem mais, ter mais, quando parecem não querer a consciência de que estão a tirar de alguém... será que não sabem?

Não sei sobre esse mundo, esse mundo que não é outro além de um que nós próprios criamos, escolhemos e permanecemos a escolher dia após dia... eu não sei...

Não sei sobre o amor ao próximo, que parece trancafiado em caixas de televisão, onde fica fácil ter-se compaixão pelo sofrimento que só de longe e superficialmente assistimos.

Não sei sobre as escolhas do dia a dia, aquelas escolhas pequeninas, que preferimos não dar atenção, importância ou dar nossa consciência, quando escolhemos passar alheios pelas ruas sem ver o sofrimento nos olhos que cruzam os nossos tantas e tantas vezes por dia... eu não sei...

Não sei por que tanto estranham o facto de eu sorrir. Não deveria eu sorrir, tendo eu tão menos problemas do que aqueles que não comem, que não tem abrigo ou calor, que podem nem mesmo ter saúde, amigos, ou alguma esperança no amanhã? Eu não sei... eu não compreendo...

Não compreendo a ganância, quando alguém ao nosso lado pode precisar de algo mais do que nós. 

Não compreendo mais a gula, quando alguém tem o estômago a doer com fome. Não compreendo carros de luxo, quando para alguém falta cadeira de rodas. Não compreendo jóias, ostentação, roupas de marca, sapatos... quando para alguém falta calor, falta alegria, falta conversa, falta compreensão... eu não sei...

Não sei como pode valer mais uma coisa do que um abraço, um olá, um carinho... eu não sei...

Não sei quais são essas escolhas que estamos a fazer todos os dias, dia após dia, a esperar por milagres, por resultados diferentes quando nós mantemos as mesmas atitudes... Como somos capazes de ainda ter esperança no milagre, se o milagre somos nós e nós escolhemos não fazê-lo?