29 de mar. de 2012

"O erro mais comum dos seres humanos é crer que ir já é chegar" Eu

27 de mar. de 2012

Tratado do Elefante Cor de Rosa - Intro

Apresento o Prefácio de uma história já escrita.

Tratado do Elefante Cor de Rosa

Prefácio

Não consigo dormir, tentei me deitar e tenho pensamentos que me trazem alguma angústia. Angústia pela própria natureza da humanidade que existe em cada um, e em mim. Não se tratam de erros ou acertos ou das motivações que existem por trás de cada uma dessas coisas.

Da mesma forma que a consciência que possuo torna possível que eu compreenda e perceba um pouco do universo e das pessoas a minha volta, também faz com que eu reflita (em demasia, muitas vezes) sobre as motivações e razões por trás da minha própria existência e personalidade.

Se me inquietou ter um dia imaginado um diálogo entre eu e a menina que eu fui, sobre tudo aquilo o que foi ou não foi realizado por mim, e se hoje essa inquietação já quase não existe, os caminhos que foram a consequência desse pensamento (imaginação) inicial tornaram-me uma pessoa que eu jamais imaginei que me tornaria.

Saber as coisas que sei, ter os pensamentos que tenho, e ter encontrado minha própria fonte de crenças, filosofias, reflexões e verdades não me torna uma pessoa melhor do que a que antes eu era. Torna-me mais consciente e sabedora de mim mesma, mas não melhor por isso.

Como quando ao se retirar uma venda dos olhos se ganha uma visão mais ampla, mas não significa que o mundo ao redor se torne mais colorido, mais bonito ou um outro mundo. A visão amplia-se mas não altera o que há para ser visto.

Talvez, com um pouco de sorte, retire alguns véus que poderiam estar a encobrir as paisagens. Se isso é melhor ou não, já é outra história.

Há muito tempo que sei que devo criar de alguma maneira uma certa disciplina e realmente escrever sobre as coisas que tenho para escrever. Mas tenho alguns preconceitos contra a minha própria maneira de escrever, o que é uma contradição, e que torna mais difícil de ser levada a sério minha decisão em escrever.

O pronome que acabo por mais usar (o eu, o escrever em primeira pessoa) aborrece-me, e embora eu reconheça o valor das coisas serem escritas desta forma, também reconheço que pode significar alguma arrogância e necessidade em se fazer ouvir (ou, neste caso, ler), sem falar no quanto se torna fácil confundir a personagem com a autora.

A iniciar por aí, posso de alguma maneira concordar com a arrogância, mas não com a necessidade de ser “lida”. E a propósito, a personagem e a autora nem sempre são a mesma pessoa.

Posso falar sem ter quem escute, desde que não me seja negado o direito de dizer. Para citar uma frase com a qual me identifico bastante: "É bom escrever porque reúne as duas alegrias: falar sozinho e falar a uma multidão." (Cesare Pavese)

Tenho sim, essa necessidade de dizer, de escrever. Seja através da palavra escrita, seja através da palavra falada. Indo mais a fundo, digo e escrevo porque o que tenho à transmitir (me) faz sentido, e embora tenha-me custado chegar à essa minha forma de ver, sentir e perceber as coisas, tenho talvez o desejo de ser contestada.

Adoraria razões plausíveis que alterassem algumas das minhas percepções.

Enfim, tanto o que tenho a dizer quanto as razões plausíveis que gostaria de conhecer simplesmente não pertencem à este nosso tempo, não agora. Seja isso para o bem, seja para o mal. E não deixa de ter alguma graça o funcionamento das coisas (das pessoas, do ser humano).

Quanto mais duro meu pensamento se torna, mais compreensiva vejo tornar-me. Quanto mais “frieza” sou capaz de transmitir e sentir, mais doçura sou capaz de ver.

Quero escrever sobre as pessoas, mas gostava também de falar sobre um elefante. Um elefante cor de rosa, pequenino, de uns 20 cm, que veio uma noite me tirar o sossego. O tal elefante era mesmo um elefante, não um desenho ou caricatura de um. Ficava em pé sobre as patas traseiras e dançava debaixo de um chuveiro enquanto cantarolava uma coisa qualquer, que interrompeu para sorrir para mim quando passei por ele.

Era um elefante encantador, que mudou a minha vida, minha forma de pensar e de ser. Foi a porta que se abriu para uma reflexão sobre a realidade, a ilusão, o que existe e o que não existe, e todos os pensamentos que daí podem se seguir.
É favor não confundir a autora com a personagem!


I

Cheguei meio que por acaso, sem ter a menor idéia de para onde ir. Pensei que poderia caminhar por horas, e não só pelos míseros quinze minutos que me custaram a chegar aqui.

Não fosse pela falta de bateria no mp3 e o casaco leve que eu vestia, teria ido muito mais longe sem dúvida.

Mas enfim, eu sabia que não haveriam outros hotéis por quilômetros, e a luz do dia já se escondia por trás da cidade, fazendo brilhar ainda mais fortes as luzes ao pé do castelo. O hotel tinha bom preço, se não tivesse não tenho idéia do que eu teria feito. Voltado para a casa, sentindo-me estúpida e sem saída, provavelmente.

Depois de subir ao quarto, com o estomago a revirar como se quisesse (ou pudesse) dar os gritos que minha garganta não dava, abri as janelas a olhar o castelo ao longe, fumei um cigarro e pus-me a pensar na vida, na minha vida, sem sentir qualquer pena de mim ou pelas minhas escolhas, mas sabendo que se naquele instante alguém me pudesse ver, não deixariam de sentir alguma comiseração, o que eu detestaria. Não conseguiriam entender que embora confusa, perdida e talvez assustada e preocupada, de alguma forma estava tudo bem.

Já não me faz mais qualquer sentido voltar para uma casa que não existe mais. Já não há qualquer razão para permanecer aqui ou para ir aonde quer que seja.

Sem casa, dinheiro ou trabalho, fica impossível ou ao menos muito difícil escolher os próximos passos para dar. Tanto faz...

Escrevo agora enquanto tomo na velocidade de uma tartaruga, uma sopa e uma pequena garrafa de vinho. Penso que com muita facilidade eu poderia abandonar as malas, roupas, computador e qualquer “coisa” (tudo isso são apenas coisas) que eu ainda tenha por hábito carregar comigo.
Se antes era uma brincadeira pensar e falar que eu atingiria um nível de desapego assim, e mergulharia em um caminho de auto conhecimento e solidão, hoje já não sei o quanto estou perto ou longe disso.

O que me parece poder ser mais “assustador” é o fato de eu não sentir arrependimento. De que adiantaria, afinal? Estou comigo e estou em mim, como poderia ser ruim?

Tenho de qualquer maneira de parar e pensar no que vou fazer amanhã. Será difícil e exigirá de mim pelo menos algum planejamento, ao menos alguma idéia de para onde ir. Pois definitivamente, já não é mais possível ficar.

Qualquer possibilidade disso morreu hoje, quando decidi ter ouvidos de ouvir e olhos de ver (a mim mesma e ao que me rodeia). A consciência passa longe de ser uma bênção...

Ir a Lisboa parece-me sem qualquer sentido, ir para o Porto igualmente...

Gostava de ter uma razão, por menor que fosse, para ir para qualquer lugar que fosse. Uma razão para ir, na esperança de encontrar uma razão qualquer para permanecer.

Eu pensei que seria aqui...

Talvez tais razões simplesmente não existam. Tenho algum medo de começar a vagar e perder-me cada vez mais.

O vinho vai a meio, o papel começa a acabar, os pensamentos procuram razão ou saída que sirvam de estímulo para enfrentar a manhã que a noite logo vai trazer, e o que eu percebo na escuridão vazia da minha mente é que já não há nada, destroços revirados, lembranças guardadas, já não há para onde direcionar o olhar.

Ao menos o vinho é bom e a visão que tenho do Castelo, linda.

II

Não imaginava como as coisas iam se desenrolar, ou como eu me veria tão rapidamente em uma outra cidade, com idéias e planos na mente, tendo já acontecido tanto (decisões?) em tão poucos dias.

É muito bom estar agora aqui com a janela para a varanda aberta, de onde posso ouvir o vento soprar nas árvores e as ondas arrebentarem junto a praia, um mar tão imenso entre uma encosta que mais parece de sonho, enquanto aguardo para ver o apartamento que poderá vir a ser a minha casa pelos próximos tempos.