25 de jun. de 2025

Faz coisa de quase um ano talvez, que abandonei o Tinder. Ah pois, eu andava lá, a ver se aparecia um príncipe encantado, um cavaleiro andante ou algo assim. Mais por curiosidade que qualquer outra coisa, depois de poucas palavras trocadas online já se notava que vá, aquilo não era nem é mesmo para mim. Mas fui ver, vi e não gostei. Ainda assim, por lá estive, a pensar que não estar nem presencialmente nem virtualmente em lado nenhum, era mesmo mal se existia em mim alguma vontade de apaixonar-me outra vez. Se a minha vida e a minha rotina (e um bocado também da minha personalidade, vá, confesso) não dão grande abertura social, ao menos tinha que tentar ver o que aquilo era (ou é).
E agora, já passado um bom tempo sem estar nem esperar nada de ninguém nem de lado nenhum, fui me dando conta de que de facto, o "problema" não são os outros - nem o que querem, pensam, esperam ou fazem. Sou eu.
Eu que não me "encaixo" nem me enquadro no que por aí, por lá, ou por cá, vi.
Gente magoada, ferida, a tentar dar à volta a situação cada um ao seu jeito, seja pelo romantismo, pela carência, pelo distanciamento, pela indiferença, pela promiscuidade ou isolamento, vi excessos de um ou de outro lado, defesas de um ou de outro jeito, mas verdadeira disponibilidade... não vi. E isso nada tem à ver com o Tinder ou outra coisas destas qualquer, tem a ver com o nosso tempo, nossas vidas, nossas histórias pessoais, nossos próprios passados, individuais. Seguimos, e da maneira que mais nos dá algum conforto seguir, que menos "remexe" nas feridas que vamos tentanto cicatrizar. Até aí, tudo certo... se esses comportamentos não nos fizessem estar justamente nos afastando cada vez mais das nossas próprias cicatrizações. É preciso sentir sim! E deixar as mágoas doerem, para que possam ser curadas. Deixar o passado passar ao seu tempo, sem atropelá-lo, sem passar para o próximo passado seguinte antes de deixar o último ter, de facto, passado.
Não estamos a correr contra nenhum relógio- ainda mais quando o relógio em causa, é o nosso relógio interior, sentimental, a essência de quem nós somos e como nos sentimos. Correr contra o nosso ritmo interior e emocional é afogarmos com a pressa tudo que ainda precisamos sentir para nos curar, para voltarmos a ser quem somos, cincronizados com nosso relógio interno sem pressas ou atrasos, sem alarmes e sem adiantamentos.
Não vi nenhuma falta de respeito, nenhum mal comportamento que não fosse antes de tudo e qualquer coisa, um comportamento auto-sabotador, auto-inflingido e auto-destruidor.
Não me deu raiva, nem rancor, nem tristeza e nem alegria ou interesse, mas... comoveu-me. Por que eu, igual ali a todos e a qualquer um, também partilhava do mesmo barco, da mesma maré, das mesmas lutas. E não foi legal ver-me assim. Nem ver ninguém assim.
Não vamos resolver feridas na internet, não vamos calar angústias com selfies ou mensagens, não vamos ser nós mesmos ignorando quem somos e o que sentimos.
Existe (ou deveria existir) vida para além de bites e de códigos, é e está acessível para todos e para qualquer um - pode não ser a viver momentos incríveis (e fantasiosos) ao lado de um príncipe encantado, mas pode ser muito mais bonito e mais real - numa caminhada tranquila, ar puro nos pulmões, brisa a soprar nas folhas das árvores e luz, imensa luz a nos tocar a pele. Até que... nos encontremos a nós mesmos. E depois, se calhar, possamos encontrar alguém mais.

12 de jun. de 2025

Mosaico

Ainda não tenho todas as peças, nem todos os pedaços.
Os que possuo, ainda não adquiriram forma, apenas vão, pouco a pouco, juntando-se.
Peguei pedaços da longa viagem, das experiências em locais distantes, uns mais passageiros e fugazes que outros, uns mais coloridos e alegres, outros mais escuros e afiados, para além das cores neutras, há aquelas mais quentes, e também as mais frias.
Ainda são apenas pedaços, que embora alguns pareçam mais inteiros que outros, são apenas pedaços.
Junto ainda outros quantos, que misturam-se àqueles mais longínquos no tempo com os mais recentes, e mesmo os atuais.
Pego do trabalho cotidiano a força e a resiliência, junto com a determinação dos trabalhos académicos, misturo com a paz e o silêncio das noites, adiciono o carinho e afeto da companhia constante de 4 patas de um rabo incansável, e vou formando a figura e desenho que ainda desconheço.
Olho serena e vejo ali, nos cacos já encaixados, a primeira viagem de avião e as primeiras despedidas, reconheço as cores mais ao lado das despedidas finais, dos abraços que foram dados pela última vez, dos primeiros encontros e de todas as ilusões que cada caco reúne. Não adivinho o desenho que se vai formando, mas reconheço-me inteira na forma que toma.
Talvez, um dia, suas formas e contornos sejam mais nítidos, talvez afinal, seja apenas arte abstrada quando acabar, mas nunca foi importante a figura final, senão a sua própria construção.
E assim, pedaço a pedaço, caco a caco, vou construindo o amontoado de cores e de formas, para ver, através do espelho em que se transformam, que os pedaços sou eu.