Sim,
a bem da verdade, é preciso que se diga... Eu quis um dia ser como uma
árvore, de tronco forte e raízes sólidas, que pudesse se envergar com os
ventos mais intensos e ainda assim não quebrar. Quis imaginar que o
inverno tornaria-me mais reclusa, para reunir forças para a próxima
primavera que viesse. Eu realmente quis ser assim... quis acreditar
que sendo uma árvore, teria minhas raízes tão fincadas que seria como
ter os pés no inferno, mas de forma que as folhas ou minha consciência
pudessem estar quase que tocando os céus. Porém, um dia dei-me conta que
humanos não são como árvores, que é preciso mover-se, embora existam
pessoas que consigam encontrar-se mesmo sem movimento algum. Não sou uma
dessas pessoas, embora gostasse de ser. Comecei a me fazer perguntas
demais, perguntas que jamais me deixariam em paz se eu não buscasse suas
respostas. E a árvore que eu quis um dia ser, aos poucos viu suas
raízes apodrecerem... Pouco a pouco, com a doença avançando, o tronco
deixou de ser sólido, e a mais leve brisa já bastava para levar embora
as folhas antes verdinhas, cheias de vida. Assim, vi-me frente a uma
decisão a tomar. Eu podia continuar com meus sonhos de ser árvore, até
que a doença me tomasse por inteiro e quando chegasse o próximo inverno,
já não haveria qualquer vida em mim. Ou então eu poderia abandonar as
raízes, o tronco, os galhos e folhas para tornar-me um fruto, uma
pequena semente. Como semente, qualquer vento me levaria embora para
lugares estranhos, onde talvez eu jamais pudesse germinar. Poderia
levar-me tambem para um lugar de solo fértil cheio de promessas. Eu
precisava escolher entre a segurança do lugar conhecido, a
previsibilidade das estações e a certeza da morte ou arriscar-me a ser
semente. Arrisquei. Hoje, não possuo mais raízes, tronco, galhos ou
quaisquer certezas. Mas vejo aos poucos uma pequena folha, tímida,
insegura e amedrontada nascer da minha casca rompida de semente. Cheia
de coragem, mas ainda com o coração gelado de medo, essa pequena folha
trás promessas de um mundo desconhecido, promessa de vida. Aonde a
doença das raízes só acontecerá se não se cuidar dessa pequenina alma
que nasce agora. E por mais que seja frio lá fora, e que não exista
muita chuva, é com o coração repleto de gratidão que vejo vez por outra
alguém aparecer com um pequeno regador e jogar um pouquinho de água
nessa folhinha que hoje sou eu. E à esses jardineiros da vida e do
mundo, todos andarilhos solitários e buscando seus próprios caminhos, eu
só posso agradecer, e tentar tornar-me a árvore mais bela que eu puder,
oferecendo assim toda a sombra de que eu for capaz quando o verão
tornar-se quente demais. Obrigada.
(março de 2010)
(março de 2010)
Nenhum comentário:
Postar um comentário