24 de fev. de 2025

Páginas


Tento me convencer das infinitas oportunidades e surpresas que só as páginas em branco podem oferecer. A infinita liberdade de escolha, dependente apenas da direção que a caneta escolhe tomar e das palavras e formas que decide utilizar.
Mas, ao pensarmos nas imensas possibilidades que só as páginas em branco nos podem oferecer, facilmente esquecemos de mencionar que só se chega nas páginas em branco depois de... virar a página.
E virar a página pode ser tão amedrontador! Tanto, que não é raro uma vastidão enorme de pessoas simplesmente paralizar ali, no virar da página. Mantém-se as linhas, palavras e frases já conhecidas, previsíveis e seguras. Param ali.
E claro, sempre se pode parar de ler um livro em qualquer altura da história - não é preciso terminá-lo, chegar ao limite, ao fim, onde não há mais páginas depois para virar, apenas, e comummente, apenas só mais uma página - em branco. Ou no máximo, com os dizeres "the end" ou "fim".
Mas... e para chegar àquela página em branco que falávamos há pouco, aquela que está mesmo no decorrer do livro (nunca sabemos ao certo quão distantes do fim ou do início estamos), temos que virar a página anterior.
Faz já algum tempo que me apanho a olhá-la, aquela boa e velha página em que me encontro, a ler, reler, observar. Como se avaliando o quão seguras - ou paralizantes - são as suas letras, o seu momento, esse tempo presente. O quão confortável é manter-me nesta página sem virá-la para o vazio em branco, indefinito, incerto.
Ora... sei eu bem, bastante bem, que não sou capaz de saltar capítulos ou parágrafos, nem de deixar a meio uma história começada.
É, sem dúvida, um bocado aterrorizante esse instante de observação, análise e reflexão. Um observar e analisar, mas já sabendo por dentro a única escolha possível. Manter as letras e linhas sob a vista, enquanto os dedos devagar sentem esses últimos momentos antes de... virar a página.
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Não há pressa. Não há indecisão nem arrependimentos, urgências oh desesperos. Respeitar o momento do momento das coisas - saber sentí-los, respeitá-los, aceitá-los e agradecer por eles.
Gratidão por saber reconhecer esses momentos, calma e serenidade para não desesperar perante o indefinido, coração aberto para aceitar o que for.
Devagar, a dar-me conta pouco a pouco, de que tudo passa a ser vivido com mais tranquilidade e consciência. Tudo passa a ser uma despedida, sendo tudo incerto, não se sabe do quê de facto se despede. Despede-se então de tudo a cada momento, faz-se presente no momento presente sem distrações, ao mesmo tempo que faz-se ir abrindo pouco a pouco lugar para tudo e qualquer coisa que surja, pois tudo é possibilidade e não há uma letra sequer na página em branco à seguir.
Tudo é possibilidade, todos os lugares e todas as coisas, todos os cenários e todas as pessoas, todos os espaços ou apenas um espaço qualquer.
Não saber, mas não se desestabilizar por não saber. Acreditar no que quer que venha à ser, aceitar o que quer que venha, agradecer por tudo o que é ou foi.
E recomeçar.